segunda-feira, 29 de abril de 2013

Intertextualidade nos livros: Homero, Virgílio, Camões e Camilo Castelo Branco

      No decorrer dos séculos vários escritores começaram a citar e parafrasear outros escritores na constituição de suas obras e de seus textos. As vozes textuais foram surgindo. Na "Eneida", o autor Virgílio lança mão da intertextualidade para construir seu texto épico, citando o autor grego Homero nos primeiros dois versos de sua epopeia. No verso "armas canto e o varão que lá de Tróia...", Virgílio referencia a obra a Ilíada no período "armas canto" (obra que relata o heroi, o grande guerreiro Aquiles na guerra de Tróia), e na segunda parte do verso "e o varão que lá de Tróia...", ele referencia a obra homérica "A Odisséia" (que relata a volta do mentor do cavalo de Tróia, Ulisses, conhecido também como Odisseu, utilizado como presente dos gregos aos troianos para por fim a guerra, mas como armadilha para derrotá-los) .
      Tempos depois o autor português Luís Vaz de Camões ao compor seu épico lusitano "Os Lusíadas" faz referência a obra Eneida, e posteriormente, em "Amor de Salvação", outro escritor português, Camilo Castelo Branco, que faz referência à obra "Os Lusíadas", de Camões, o que mostra que a circulação dos textos está intimamente relacionada à produção dos textos no tempo e no espaço de sua criação, e claro, para atender também o objetivo do autor naquele período histórico específico.

domingo, 14 de abril de 2013

Intertextualidade em "O auto da compadecida"

Link para o filme "O auto da compadecida": http://www.youtube.com/watch?v=iSd67a_L9nA

      

      O filme brasileiro "O auto da compadecida", dirigido por Guel Arraes e lançado em 2000 é um diálogo entre obras nordestinas como cordeis e histórias do cangaço, mas principalmente com o livro do gênero teatral de mesmo nome do filme, do autor paraibano Ariano Suassuna, que por sua vez, buscou nos autos do autor Gil Vicente inspiração para escrever a sua peça teatral em 1955 e publicá-la em 1957. O filme retoma em sua grande parte aspectos do livro para tratar de temas como a moral religiosa, a avareza, um dos sete pecados capitais, que é cometido no filme por vários personagens, inclusive pelo padre, bem como para retratar bem a cultura nordestina, os grandes coroneis detentores de terra e poder, a opressão, e a relação do homem com o divino, vista principalmente na hora do juízo final, que apresenta cenas bem divertidas.


sábado, 13 de abril de 2013

Intertextualidade com a Bíblia no quadrinho da Mafalda


      O quadrinho ao lado, retirado do livro Toda Mafalda em Português, tem seu humor baseado na intertextualidade com o texto bíblico, encontrado em Gênesis 3: 19: "Porquanto és pó e em pó te tornarás". Assim, a "cosmética" passa a não ter nenhum efeito sobre a velhice, é apenas vaidade de acordo com essa referência bíblica.
       

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Intertextualidade em "Poema de sete faces" e "Com licença poética"


Poema de sete faces

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.
As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.
O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas, pretas, amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.
O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode,
Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.
Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.
Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.

Carlos Drummond de Andrade

Com licença poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
-- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,

já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.



Adélia Prado



   O poema "Com licença poética", da poetisa Adélia Prado apresenta intertextualidade com "Poema de sete faces", de Carlos Drummond de Andrade, já que começa fazendo alusão a figura do anjo que anuncia o "cargo", a "ocupação" futura do eu-lírico. A frase inicial é a mesma nos dois poemas, exceto pelo adjetivo "torto" que caracteriza o anjo do poema de Drummond e pelo adjetivo "esbelto" que caracteriza o anjo do poema de Adélia Prado. Já na décima sétima linha do poema "Com licença poética" há a frase "vai ser coxo na vida é maldição pra homem", que explicitamente retoma o poema de Drummond, pois em sua terceira linha  diz ser maldição na vida o "ser gauche", cujo significado é "ser coxo". 
    O "Poema de sete faces" ainda apresenta intertextualidade com a Bíblia ao citar na décima oitava linha a frase: "Meu Deus, por que me abandonaste", frase encontrada no Evangelho de Mateus, capítulo 27, versículo 46, que diz: "Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?".

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Intertextualidade com a famosa travessia beatleniana


      Essa imagem retirada da página do facebook "Indiretas do bem" ao querer instigar a ação consciente dos pedestres no trânsito de se atravessar a rua utilizando a faixa de pedestres traz a intertextualidade à tona, pois junta a frase à famosa imagem do grupo musical de Liverpool, The Beatles, atravessando a Abbey Road, em Londres.

HQs + Matemática + Humor = Intertextualidade


      Na tirinha acima, a personagem do argentino Quino, Mafalda contracena com a sua mãe. Mafalda está brincando, dizendo ir "rumo ao infinito". A mãe dela com tom de voz enérgico lhe diz que sua "paciência tem limite" ao que Mafalda lhe responde: "o infinito também". Há uma intertextualidade clara nessa HQ com a matemática que causa o humor, já que o tema abordado é o infinito, muito estudado em vários campos, mas principalmente nas ciências, na matemática. Há teóricos que afirmaram e afirmam que o infinito não tem fim, não tem limite, enquanto há outros que acreditaram e provaram em seus teoremas que o infinito tem fim, como é o caso de Isaac Newton, que estudou o infinito e a noção de limite, estudada nas disciplinas de Cálculo, da Física, da Matemática etc. Se há ou não limite no infinito não se sabe ao certo, mas que a intertextualidade nessa tirinha existe, isso é muito certo.

"Pra que mentir?" e "Dom de iludir": uma voz que responde a outra

"Toda enunciação, mesmo na forma imobilizada da escrita, é uma resposta a alguma coisa e é construída como tal" (BAKHTIN, Mikhail/ VOLOCHINOV. Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo: Hucitec, 1997).

      Tendo em vista a frase citada acima do teórico russo Bakhtin verifica-que que toda palavra escrita é uma resposta direcionada a algo, a uma situação ou pessoa específicas. Para exemplificar tal afirmação, usaremos as músicas "Pra que mentir?", de Vadico e Noel Rosa e "Dom de iludir", de Caetano Veloso.


      A música "Pra que mentir?" foi escrita por Noel Rosa, de parceria com Vadico, enquanto Noel Rosa passava por uma relação amorosa com Ceci, que marcou muito a sua vida. Ceci, por sua vez, mantinha um relacionamento com ele e com Mário Lago ao mesmo tempo, o que fazia com que Noel Rosa lhe dissesse que ela ainda não havia aprendido a mentir.



      Então, Caetano Veloso escreve a música "Dom de iludir" como resposta a música de Noel Rosa. Enquanto esse último coloca em sua letra uma voz masculina que chama a mulher de mentirosa e traidora, Caetano Veloso, coloca em sua letra uma voz feminina que acusa o homem de mentir também de forma dissimulada, fingindo ser verdade o que é na realidade mentira, apenas para iludí-la. Ou seja, no jogo do amor tanto homem como mulher acabam dissimulando e mentindo.
      Enfim, a intertextualidade nessas duas músicas acontece implicitamente quando uma responde a outra em seu conteúdo, como afirma a frase inicial de Bakhtin.

Intertextualidade em "Língua", de Caetano Veloso


      A música "Língua" (1984), de Caetano Veloso, apresenta marcas da intertextualidade explicitamente e implicitamente. São citados na letra autores como os poetas portugueses Fernando Pessoa e Luís Vaz de Camões, que já é citado na primeira frase da música, o escritor brasileiro Guimarães Rosa, o poeta Olavo Bilac, Chico Buarque de Holanda, Carmem Miranda etc. Na primeira estrofe, há uma frase entre aspas: "Minha pátria é minha língua". Essa frase se encontra no livro de poemas de Fernando Pessoa, intitulado Mensagem. Assim, verificamos que a canção de Veloso é um arranjo de vozes de vários escritores e poetas de diferentes épocas e características, mas que contribuem para a criação de "Língua", já que ambos os autores citados trabalharam de alguma forma a história, as raízes de formação da nossa língua materna, o português.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Intertextualidade na música "Monte Castelo" (Legião Urbana)


       O vídeo acima da banda brasileira Legião Urbana é um exemplo clássico de intertextualidade. A música "Monte Castelo", faz inferência inicialmente aos versículos bíblicos 1 e 4, encontrados no livro de Coríntios, no capítulo 13. São eles: "Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine" (versículo 1) e "O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece" (versículo 4). 
           E na segunda parte ao soneto 11 do poeta português Luis Vaz de Camões, soneto que é citado integralmente na música. Desse modo, verifica-se que há o entrecruzamento de duas vozes na letra da banda, a da tradição judaico-cristã e da literatura renascentista do século XVI. O grupo musical então, fez uma recriação artística na composição de sua música por meio da intertextualidade.

Soneto 11

"Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói e não se sente,
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer. 
É um querer mais que bem querer,
é solitário andar por entre a gente, 
é nunca cotentar-se de contente,
é cuidar que se ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade,
servir a quem vence, o vencedor,
é ter com quem nos mata, lealdade, 
mas como pode causar em seu favor,
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo amor?"

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Vozes textuais: como aparecem?

       A intertextualidade em um texto, poema, música, quadrinho ou filme pode ser verificada por meio de "vozes" implícitas ou explícitas. As vozes explícitas são aquelas mostradas no texto, aquelas que são citadas nitidamente, podendo ou não referenciar o autor original da obra, enquanto que as vozes implícitas não são demarcadas com precisão. Enfim, essas vozes são marcas da intertextualidade e estão a serviço de quem quiser utilizá-las na construção de seu texto, poema, música ou filme. Aqui, nesse blog priorizaremos as vozes explícitas, demarcadas e mostradas. No trecho abaixo, podemos perceber que o autor, Rubem Alves, citou Mário de Andrade explicitamente, colocando entre aspas a frase do poeta paulista.

Exemplo de voz demarcada em um texto:


“[...] Sem tempo para lidar com mediocridades. Não quero estar em lugares onde desfilam egos inflados. Não tolero gabolices. Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte... Lembrei-me agora de Mário de Andrade que afirmou: "as pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos". Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa.” (Rubem Alves)


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

FIORIN, L. et PLATÃO.  Lições de texto: leitura e redação. São Paulo: Ática, 2001.
   




O que é intertextualidade?



        O termo "intertextualidade" foi utilizado por Júlia Kristeva, em 1969, para tratar do termo "dialogismo", cunhado pelo teórico russo Mikhail Bakhtin, na década de 20. De acordo com Bakhtin (1992), os textos entrecruzam vozes de outros textos, frases, pensamentos, palavras, citações de outros autores, marcando assim, a polifonia do discurso. Dessa forma, não há nenhum texto que não se ancore em outro texto e nem que não guarde em si nenhuma voz dita ou escrita em um determinado tempo-espaço. Esse blog pretende, então, trazer conceitos, explicações e exemplos de intertextualidade na literatura, música, cinema, HQs, entre outros.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.


“Tudo se reduz ao diálogo, à contraposição enquanto centro. Tudo é meio, o diálogo é o fim. Uma só voz nada termina, nada resolve. Duas vozes são o mínimo de vida” (Mikhail Bakhtin).